As noites que passamos durante a pandemia foram as melhores, você pintava quadros enquanto eu dormia em frente à televisão, as vezes eu assistia um filme de Natal que passava no canal Studio Universal.
Entre uma tinta e outra, você me mostrava ansioso o quadro em esboço, geralmente não estava ruim, mas as vezes a perspectiva não estava boa, era necessário fazer alguns reparos.
Não me esqueço das vezes em que você pegava os seus quadros e fazia uma pequena exposição na sala, em frente à televisão, todo orgulhoso, tentando achar qual deles era o melhor. Eu dava meus pitacos, achava que assim, seria importante, afinal, aquilo tudo era significativo e fazia sentido.
Quando passava das dez da noite, você fazia um lanchinho com presunto e queijo para a gente comer, pois sempre dava uma fominha especial. Você colocava no "quentinho" para fazer um lanche mais saboroso, ele ficava crocante e meio cascudinho, mas era muito bom e aquele gesto de certa forma, me deixava alegre.
Quando o mês de maio de dois mil e vinte chegou, a vida mudou bastante. Logo no começo do mês, a Coty chegou. Tudo tinha que ser infantil, afinal, a criança chegou e a alegria veio junto, embora alegria fosse um sentimento que não faltasse, por mais problemas que houvesse, a gente sempre carregava com leveza e sapiência.
A Coty dormia cedo, então, dava tempo de fazer a pintura de todo dia, enquanto a gente ficava trancado em casa. Você colocava a Coty na cama e depois ia arrumar o "circo", pegava as mesas, o estojo de pintura, colocava próxima ao sofá e a gente ia conversando a paisagem da vez, enquanto o cheiro das tintas recendia a nossa casa e eu pegava no sono, deitada no sofá, aguardando a chamada para ir à cama.
Entre um quadro e outro, você me chamava e eu quase dormindo, dava palpite a esmo, muitas vezes falava coisas sem sentido, também, eu dormia profundamente e acordava com o quadro em meu rosto, com aquele cheiro de tinta fresca, tendo que opinar de forma rápida, era missão quase impossível. A Coty, vez em quando acordava, chegava na sala com a chupeta na boca e a “naninha” pendurada pedindo para todo mundo ir à cama e assim a pintura terminava, era hora de recolher a bagunça da sala.
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